Editorial: manchas e manchas

19/10/2019 23:24


Editorial: manchas e manchas

É realmente impossível, por mais que se tente, escapar da incontrolável correnteza da mídia em toda parte, em todos os lugares, toda hora, de minuto em minuto, falando, comentando, justificando, condenando, fuçando, gritando sobre as manchas de óleo que invadiram as costas nordestinas.

Sem dúvida, o maior desastre ecológico na região, devastador do ecossistema com uma amplitude imensurável, sob qualquer aspecto, um crime hediondo contra a natureza. Cientistas, defensores do meio ambiente, as autoridades de todo o país, o povo, enfim, um grito de desespero ecoando com desalento pelos céus. 

Sem o menor laivo de ironia ou analogia esse manancial de óleo e de sujeira criminosa está sendo resolvido na tora, como se costuma dizer. Há uma consciência coletiva, um desprendimento voluntário de tal monta que envolve a todos. E este é o ponto positivo que merece ser sublinhado, destacado e aplaudido. 

Até mesmo os aproveitadores de plantão, peritos em espalhar mentiras, distorcendo a realidade com suas especificidades politico-ideológicas, mantêm o mesmo foco: acabar com essas manchas destruidoras.

Essa desconhecida avalanche de óleo que tanto mal está causando e, por extensão, vai gerar prejuízos incalculáveis, tem uma indissolúvel semelhança com o polvo da corrupção que devastou nosso Brasil e, ainda hoje, continua como potencial obstáculo a todo esforço que está sendo empenhado na recuperação dos seus danos.

O cataclismo da corrupção foi identificado através de uma ação saneadora que começou em Curitiba. Mas, a mancha da corrupção continua apresentando seu rastro de destruição em todos os cantos e recantos de nosso país. Da mesma forma que as ondas de óleo conseguem superar as redes de contenção, exatamente por ter mais densidade que as águas, a corrupção procede de igual maneira. Mais pesada que a superfície da legalidade a corrupção continua avançando, e surgindo em toda parte, em todos os setores. 

Em Sergipe, só este ano, três Prefeitos tiveram seus mandatos cassados por corrupção e outros processos continuam sendo avaliados. As manchas de utilização indevida do dinheiro como valor de troca por votos ou enriquecimento acelerado de gestores públicos aparecem diariamente, utilizando-se do peso imoral de tramoias como “laranjas” “rasgadinhas” e artifícios sempre astutos para burlar a fiscalização e a lei.

A atenção e os cuidados com a saúde do povo ficam prejudicados. Com tantos escândalos de rapinagem escancarada a população morre à mingua nos corredores superlotados de hospitais. A Educação sufoca sob a carência de recursos que foram canalizados por dutos de desvios inexplicáveis e injustificáveis. Os professores ficam financeiramente descompensados e os alunos desamparados por falta de um magistério competente. A Segurança periclita por inanição de recursos para enfrentar o crime cada vez mais organizado e poderoso. E perdemos anualmente mais vidas numa proporção recorde. 

A diferença entre as manchas é que, as de óleo estão sendo controladas e dá para recolher suas placas negras nas praias onde são jogadas. 

O que produz perplexidade é sentir que as manchas da corrupção, embora tenha sido alvo de uma boa limpeza, continua sob o risco de ser estancada. Os freios à sua ação saneadora estão sendo manipulados por mentes poderosas. E a devastação que a corrupção impõe é uma mancha bem maior, e mais destruidora. 

É aí que mora o perigo maior.

 

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