Artigo: Pérolas da UFS II - Por Juviano Garcia

26/05/2022 11:45


Artigo: Pérolas da UFS II - Por Juviano Garcia

Artigo: "Pérolas da UFS" - por Juviano Garcia

Esta página dedico exclusivamente ao ilustre professor de Química da UFS, José Barreto Fontes – Barretão – um dos mais eminentes mestres da UFS, uma mente brilhante, cientista renomado no sul do país mais do que no próprio Estado de Sergipe, foi ele que desenvolveu a fórmula para industrialização da água de coco, além de criar um protótipo de usina de beneficiamento de lixo, testado e aprovado pela Prefeitura de Aracaju, porem esquecido em seguida; foi um grande estudioso da cocoicultura em Sergipe, entre outros legados que deixou à cultura e à ciência sergipanas. Aqui, porem, pretendo evidenciar tão somente o seu lado humorístico, que o fazia um interlocutor imensamente agradável.

Conheci Barretão durante os trabalhos do projeto de construção e implantação do Campus da UFS, por volta de 1977, quando levantávamos dados para dimensionar as necessidades de espaço físico, instalações e aquisição de equipamentos para os laboratórios de ensino e pesquisa no novo espaço físico da UFS. A sua colaboração foi inestimável, tal o seu conhecimento e o seu interesse pela instituição.

Após a transferência de todas as unidades para o Campus, ficamos fisicamente mais próximos e ele, sempre que podia, visitava-me na Coordenação de Programação Orçamentária – COPRO – e, invariavelmente, sua saudação era: “Juviano, o homem que trabalha na merda”. Isso porque, me explicava ele, COPRO, é o prefixo grego que significa dejetos, merda mesmo. Em cada uma dessas visitas me relatava histórias muito engraçadas, algumas das quais relato a seguir.

Dizia-me ele ser filho de um ourives pobre e semianalfabeto de Laranjeiras, o Sr. Sindulfo e isso era um contraste gritante entre ele e o seu pai. –“Veja, Juviano, meu pai, a despeito de ser quase analfabeto, vive do ouro; eu, no entanto estudei tanto, tenho curso superior, montei um laboratório de análises clínicas, vivo, portanto, da merda, como você aqui na COPRO”.

“Quando éramos meninos, lá em Laranjeiras, meu pai nem sempre tinha dinheiro suficiente pra comprar carne, então comprava bacalhau, que na época era muito barato, e minha mãe fazia ensopado de bacalhau com mamão verde: 100gr de bacalhau para dois mamões; meu pai comia o bacalhau para ter substância para trabalhar e nós comíamos o mamão”.

“Após o jantar meu pai gostava de sair com os amigos pelas ruas de Laranjeiras, fazendo serenata e tomando umas e outras, o que incomodava minha mãe que sempre lhe pregava o mesmo sermão: Sindulfo, você devia se dedicar mais à sua família como faz o pastor nosso vizinho. Não sabia ela que o pastor tinha um caso com a viúva do outro lado e, nas madrugadas, entrava por um buraco na cerca do quintal da viúva. Então, certo dia meu pai foi na casa da referida senhora e, alegando ter perdido a chave de sua casa, lhe pediu emprestada a sua. Poucos instantes depois voltou dizendo que a chave não serviu e pediu a chave da porta dos fundos, da qual tirou um molde em sabão e fez uma réplica. Naquela noite esperou o pastor entrar na casa da viúva, foi sorrateiramente até a porta dos fundos e colocou na fechadura, em cruz, a réplica da chave que tinha feito. Ato contínuo foi pra rua e convidou os colegas para ir fazer serenata na frente da casa da viúva. Na hora de sair, o pastor não conseguindo abrir a porta dos fundos, teve que sair pela frente, no que foi flagrado pelos seresteiros. No outro dia era o comentário de Laranjeiras a atuação do pastor. À noite meu pai permaneceu em casa e minha mãe então perguntou por que ele não ia sair, ao que respondeu: Você não quer que eu aja como o pastor”?

Sindulfo mudou-se para Aracaju e montou uma relojoaria na Rua Laranjeiras (que coincidência) quase em frente aos Correios, onde eu comprei minhas alianças. Nenhum cliente ousasse pechinchar que ele logo recolhia a mercadoria dizendo: “Pode ir, você não quer comprar nada não”.

Conta-se que, certa feita, uma empresa americana que prestava serviços à PETROBRAS e tinha sede em Barra dos Coqueiros, perdeu o segredo do cofre e mandaram alguém a Aracaju procurar quem pudesse abri-lo. Indicaram-lhe Sindulfo, que prontamente foi à empresa e em poucos minutos tinha aberto o cofre. Ao dizer o preço pelo serviço um dos americanos reclamou que estava muito alto para o tempo que ele levou para dar conta do serviço. “De pronto Sindulfo fechou-o cofre e murmurou: agora só abro pelo dobro”.

Barretão tinha um sítio nas proximidades do aeroporto de Aracaju, onde costumava passar os fins de semana. Na visita do então presidente Castelo Branco a Aracaju estava ele em seu sítio quando um veículo do exército adentrou a cancela e dele saíram vários soldados armados para cuidarem da segurança do presidente. Um seu empregado, vendo aquele movimento, correu a avisar Barretão. Este deu cabo de uma corrente e dois cadeados, foi onde estava o veículo do exército e o acorrentou à cancela, afastando-se a seguir e ficando por perto. Os militares, ao chegar ao local e perceber o veículo acorrentado, dirigiram-se a Barretão e lhe questionaram se sabia quem fez aquilo. Foi o dono do sítio, respondeu. Vai chamar esse sujeito aqui, disse um soldado ao que Barretão respondeu: Tá falando com ele.

O comandante da operação lhe interpelou com essas palavras: Você sabe que esse veículo é propriedade do exército? Barretão respondeu: sei sim, e você sabe que vocês invadiram meu patrimônio sem minha autorização?

Após alguns minutos de discussão os militares resolveram leva-lo até o 28 BC e, lá chegando, à presença do comandante que foi logo lhe perguntando: quem é você para prender um veículo do exército? Barretão respondeu à altura: Eu sou Barreto Fontes, químico, professor da UFS, todo mundo em Aracaju me conhece e você quem é, que ninguém nessa cidade jamais ouviu falar do seu nome?

Desse diálogo nasceu uma forte amizade entre os dois, de sorte que, todos os fins de semana que podia, o comandante ia para o sítio de Barretão tomar Uísque com ele.

Lembro-me de uma conferência sobre cocoicultura da qual participei. Um dos palestrantes era um agrônomo filipino que não falava português. O estudante de inglês contratado para fazer a tradução simultânea da palestra, começou a se perder durante a mesma, quando Barretão sentado na primeira fila do auditório, subiu ao palco tomou o microfone do tradutor e disse: ”Dê-me aqui esse microfone que eu vou fazer a tradução. A palestra tem muitos termos técnicos e você está mais perdido do que cego em tiroteio” Imaginem o burburinho que isso gerou no auditório.

 

Compartilhe

Veja Também

Receba Notícias Pelo WhatsApp