Crônica: O delinquente conhecido por Inácio Brinquinho - Por Achimedes Marques
22/11/2021 13:46
Crônica: O Delinquente conhecido por Inácio Brinquinho
Por Archimedes Marques
Das histórias pouco conhecidas, guardadas apenas pela lembrança do povo passada de geração a geração que termina virando lenda há uma passagem de horror ocorrida na aprazível Laranjeiras, a segunda cidade mais antiga do Estado de Sergipe, a Laranjeiras que nasceu de uma flor, da perfumada e bela Flor das Laranjeiras, que simboliza a virgindade das noivas, a estonteante Laranjeiras eterna noiva do Cotinguiba, a admirada Laranjeiras princesa das letras sergipanas, da fidalguia de sua grandeza cultural, exaltada pelo amor dos seus filhos que a dignificam e a enobrecem. A amada Laranjeiras de tantos amores e de alguns horrores dentre os quais a história do delinquente conhecido por Inácio Brinquinho, um valentão desordeiro que fez verdadeiro terror em meio a essa pacata comunidade sem ser incomodado pelas autoridades constituídas daqueles tempos idos e inóspitos.
Consta que o Inácio Brinquinho assim era chamado porque usava brincos em imitação aos antigos piratas dos sete mares e, mais de perto os adornos femininos de todos os tempos. Inácio Brinquinho era de origem desconhecida e ali em Laranjeiras chegou, gostou e ficou. Fixou residência e passou a atazanar a população, ganhando fama de cruel matador e, ao matar as suas vítimas fazia questão de decepar as suas cabeças para sair mostrando a população, desafiando a tudo e a todos, principalmente as autoridades policiais que nunca conseguiam pegá-lo, por incompetência, medo ou por conveniência. E dessa fama de mau, dessa fama de impiedoso sanguinário ele fez o seu “ganha pão”, não somente ganhando dinheiro para matar, mas também assaltando ou extorquindo as suas vítimas.
Desse modo ele mandava bilhetes para determinadas personalidades pedindo quantias em dinheiro ou joias e caso elas não o atendessem podiam contar como morte certa. Cedo ou tarde seriam atocaiadas e mortas com tiros de bacamarte para em seguida ter suas cabeças decepadas a golpes de facão. Isso ele fazia com todo o prazer, até mesmo para amedrontar as futuras vítimas e se fortalecer para as novas extorsões. E de todas elas, perpetuando o terror, fazia questão de apresentar em determinados lugares, os macabros troféus, as suas cabeças, por vezes colocadas no balcão de botequins enquanto tomava doses de cachaça em comemoração. Sempre que a polícia chegava ele já estava “entocado” no seu desconhecido esconderijo mato adentro, pois certamente não havia quem se atrevesse a segui-lo.
Assim, Inácio Brinquinho ia aumentando o seu rosário de crimes. Assim, Inácio Brinquinho ia desafiando as leis. Assim, Inácio Brinquinho ia driblando a polícia e a justiça. Assim, Inácio Brinquinho ia aumentando mais e mais a sua fama. Assim, o nome de Inácio Brinquinho passou a ser temido por todos os laranjeirenses e além fronteiras. Por evidencia Inácio Brinquinho era protegido por grandes e covardes personalidades que o contratavam para mortes dos seus inimigos e por consequência ficavam de “rabo preso” a ele. Talvez por isso a sua tranquilidade em saber que nunca seria preso, muito menos morto, pois fora das autoridades constituídas não havia homem corajoso em Laranjeiras para enfrentá-lo.
Mas, se não havia homem algum com coragem bastante para enfrentar Inácio Brinquinho, apareceu uma mulher. Desse modo, o “reinado” de Inácio Brinquinho se acaba no dia em que ele mata a pessoa errada, uma pessoa que ele não poderia matar, um homem que tinha em sua retaguarda uma verdadeira mulher, uma mulher corajosa, uma mulher de fibra, uma mulher de “sangue no ôio” como diz o matuto.
Assim, o Inácio Brinquinho mandou um bilhete de extorsão para um morador do Engenho Ibura e como a resposta fora insatisfatória, ou seja, o cidadão mandou dizer-lhe que não lhe daria dinheiro algum. Não demorou e, dias depois se ouviu um tiro e logo uma nova cabeça era apresentada ao povo de Laranjeiras, o seu novo troféu.
A viúva, por sua vez, fez questão de não “chorar o defunto”, procurou um amigo da família conhecido por Chiquinho de Cambôa, um pescador afamado, dos melhores “tarrafeiros” da região e lhe ofereceu todo o dinheiro e joias que possuía pela cabeça de Inácio Brinquinho. Aceitando o desafio o mestre das tarrafas bolou um plano e contratou mais dois amigos para a difícil empreitada. Então, quando Inácio Brinquinho saiu da “toca” para outra tocaia e morte de alguém, fora atocaiado e barbaramente assassinado a tiros de garrucha, cacetadas e punhaladas antes que pudesse reagir com o seu bacamarte, vez que estava todo enroscado em uma grande tarrafa magistralmente arremessada de cima de uma ribanceira quando da sua passagem. Assim, para o delírio dos laranjeirenses, Chiquinho de Cambôa garbosamente desfilou pelas ruas de Laranjeiras com a cabeça de Inácio Brinquinho até depositá-la aos pés da viúva, no Engenho Ibura.
Autor: Archimedes Marques
Delegado de Polícia. Graduado em Direito pela UNIT e Pós-Graduado em Gestão Estratégica em Segurança Pública pela UFS.
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